Um trecho do livro "Apaixonado pelo mundo", de Yongey Mingyur Rinpoche
Sem algum entendimento das transições naturais, é fácil ficarmos presos a uma situação. Há muitos anos, li um artigo em um jornal sobre uma mulher que pediu o divórcio após trinta anos de casamento. Ao contrário das queixas mais comuns de infidelidade e abandono, essa mulher explicou ao juiz: ele não é o homem com quem me casei.
Agora eu me perguntava: seria possível entrar em uma relação tal como entramos em um trem? Sabemos que o trem vai andar, depois parar e se movimentar de novo, e as paisagens e o ambiente vão mudar. E se entrarmos em um relacionamento sabendo que a emoção do novo romance, ou a empolgação sobre a nova parceria comercial ou o encontro inicial com um mentor espiritual, no futuro, não será igual ao que foi no começo? E se a nossa expectativa for de que as novas circunstâncias positivas mudem, em vez de desejarmos que continuem as mesmas? O trem faz muitas paradas. Não tentamos prolongá-las, nem esperamos que ele fique em um lugar só. Ele passa por vários lugares, assim como passamos pelos bardos.
Os bardos nos mostram que tudo está sempre em transição. E, se renascer aplica-se às transições entre as identificações mentais no curso dessa vida ou ao longo de muitas outras, o desafio permanece o mesmo: nós nos libertarmos, abrindo mão de nos apegarmos às narrativas construídas pelo eu. Mesmo que não possamos identificar com precisão o início ou o fim de alguma coisa, incluindo os estágios do bardo, pode ser útil juntar as coisas em categorias. Cada bardo reúne características específicas de cada etapa da nossa jornada. As características do bardo natural desta vida oferecem oportunidades para despertar que são interdependentes, embora não sejam as mesmas oportunidades do despertar do momento da morte. Familiarizar-nos com as características que proporcionam o despertar em cada etapa significa reconhecer as grandes oportunidades para transformarmos confusão em clareza.